
A criação de abelhas sem ferrão, a meliponicultura, tem atraído cada vez mais atenção de pesquisadores e empreendedores. Além de seu papel ecológico essencial, a prática vem sendo reconhecida como atividade promotora da sustentabilidade. É nesse contexto que atua a Ecoflorada, startup fundada pelo biólogo Roberto Ribeiro, de Cuiabá, que participa do Inova Pantanal, programa do Sebrae voltado a acelerar negócios de bioeconomia ligados à preservação dos biomas.
Ribeiro transformou o manejo ecológico de abelhas nativas em uma ferramenta para aproximar empresas da pauta ambiental. “A ideia é aproximar o setor corporativo da conservação por meio da polinização. A ausência de polinizadores empobrece as áreas verdes e prejudica a regeneração. Nosso trabalho permite mensurar o impacto positivo quando as abelhas são reintroduzidas”, explica.

Segundo o biólogo, o projeto da Ecoflorada não tem foco na produção de mel, mas na implantação de meliponários corporativos, espaços de manejo de abelhas em áreas empresariais. “A gente faz um diagnóstico da presença de polinizadores, instala colmeias e, depois, mede o aumento de espécies na região. É possível comprovar cientificamente o ganho de biodiversidade”, diz.
Ribeiro trabalha atualmente com quatro espécies nativas e deve ampliar para nove até o próximo ano. Cada uma delas tem um papel ecológico distinto: algumas polinizam plantas rasteiras, outras atuam em arbustos ou em árvores de copa alta. “As abelhas se distribuem por diferentes extratos da vegetação. Elas criam uma rede ecológica complexa e complementar”, afirma.
O projeto nasceu da experiência do pesquisador com a meliponicultura e de seu interesse em alinhar conservação da biodiversidade e sustentabilidade empresarial. “A pauta ESG não deve ser só um discurso. Quando fundamentada em dados científicos, ela gera resultados ambientais reais”.
Parcerias e educação ambiental
A startup já mantém parcerias com a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e o Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT) para pesquisas e cursos voltados à formação de novos meliponicultores. Ribeiro também tem projetos com escolas estaduais que utilizam as colmeias como ferramenta pedagógica. “A educação é uma das chaves. Antes de levar a meliponicultura ao setor corporativo, é preciso criar base técnica e consciência ambiental”, explica.
No momento, a Ecoflorada está em fase de validação do modelo, com previsão de três implantações corporativas no próximo ano. A aposta é que empresas interessadas em sustentabilidade vejam as colmeias como parte de uma infraestrutura ecológica permanente, e não apenas como uma ação de marketing verde.
Meliponicultura como ciência e cultura
Pesquisas sobre abelhas sem ferrão têm se multiplicado no Brasil e no mundo. O artigo “Modelo teórico para análise interdisciplinar de atividades humanas: a meliponicultura como atividade promotora da sustentabilidade”, publicado na revista Ambiente & Sociedade por Celso Barbiéri e Tiago Mauricio Francoy, ambos da Universidade de São Paulo (USP), destaca a relevância científica e social da prática.
“A meliponicultura, além de conservar polinizadores, é uma atividade promotora da sustentabilidade, pois envolve dimensões ambientais, culturais, sociais e econômicas”, escrevem os autores. Eles defendem que a criação racional das abelhas deve ser incentivada por políticas públicas interdisciplinares que unam meliponicultores, cientistas, governos e empresas.

A ciência aponta que cerca de 75% das plantas com flores do planeta dependem de agentes polinizadores, e que as abelhas, sobretudo as nativas sem ferrão, são imprescindíveis nesse cenário. “O declínio dessas populações, causado por desmatamento e agrotóxicos, ameaça diretamente a biodiversidade e a produção de alimentos”, afirmam Barbiéri e Francoy.
“Aprender com as abelhas”
Para Ribeiro, o comportamento das abelhas inspira novas formas de pensar a sustentabilidade. “Algumas abelhas natuvas são classificadas dentro da biologia como abelhas sociais, organizadas em sociedade. Elas vivem em comunidade e trabalham pelo bem comum da colmeia. Isso é um exemplo de organização socioambiental. A conservação precisa nascer da sociedade, não só das empresas”, diz.
Ele defende o que chama de “pensamento de colmeia”: a cooperação entre indivíduos e instituições para regenerar o meio ambiente. “São oito bilhões de pessoas no planeta. Se cada uma fizer sua parte, teremos oito bilhões de projetos de conservação acontecendo ao mesmo tempo”, resume.

